domingo, 28 de outubro de 2007

Perspectiva

-Sobe um pouco, olha e vê se encontras.
Subo e olho, olho mas não encontro.
-São todos iguais.
-Ah! São nada.
-Sobe tu.
-Pois são...

sábado, 27 de outubro de 2007

Escolhas

Chega uma hora em que a confusão é tão grande que já ninguém sabe bem quem é o que é ou ou que anda a fazer. Chega o dia em que a confusão é ainda maior. Chega a vez em que a teimosia dos actos leva a um arrependimento que nem sequer o é. E em dias em que se perde mais uma vida mais ou menos próxima a terra gira na mesma e nada para. Segue tudo no seu ritmo incerto até ao infinito dos dias.

Entre o que achava que devia fazer e o que queria ou não fazer escolhi o não querer. Agora a confusão é grande. Já passou e a vida segue algures por ai. Entre as escolhas de pessoas não muito normais que confundem as ideias que surgem entre dias claros e escuros ao mesmo tempo.

De fora

Cai a noite e e lua fica lá no alto a brilhar que nem tola. Há entre dois lados de dentro um lado de fora onde fico, escassos metros e só o céu negro por cima, vê-se a lua lá do alto, cai ar fresco naquele espaço.

Seguem as canções. Novas, velhas, algumas já gastas de tanto cantadas, de tanto ouvidas, saem palavras, desfazem-se conversas num abrir e fechar de olhos. Não chove e há água no chão.

Há a distância fisica, só essa, há um entender maior que surge entre copos de plástico que vão ficando vazios e há o saber de ser, o saber que se é. O poder juntar passados e presentes e vê-los literalmente de mão dada a correr no meio de caras e corpos espalhados num canto junto ao rio.

Entretanto os outros olham e não vêm, e se vêm não percebem e acho na sua pequenez a grandeza de poucos, meia dúzia de irredutiveis que ainda vão acreditando que o amanhã não existe e os meteoritos caem do céu a toda a hora.

I

"But they don’t know how really feels
They’re just here on holidays
Like dummies filling landscapes
How could they see you cry?"

David Fonseca, Superstars II

II

"When you held me,
we fought windmills together"

The Gift, Pure

quarta-feira, 24 de outubro de 2007

mANTA

Vou pegar na seda da teia, no algodão dos sorrisos e nas cores do arco-irís e fazer uma manta daquelas bem quentes. Uma manta grande e colorida para que me possa enrolar enquanto espero que o tal comboio passe novamente pela estação.

Hei-de esperar ali no canto onde passe pouca gente e sejam não muitas as vozes que dispersam a atenção do olhar para o nada. Aquele nada que está ali mesmo na parede pintada de uma cor que já ninguém sabe dizer qual. Olho para o infinito que pode haver no tal nada e imagino muito mais do que pode ser imaginado pelo comum dos mortais que habitam o lado de dentro do bolo que é a vida.

Vou adormecer, acho, hei-de acordar a tempo, espero. Ou então pode ser que me acordem a tempo de entrar na carruagem...

Pensar...

Tenho tanto sentimento
Que é frequente persuadir-me
De que sou sentimental,
Mas reconheço, ao medir-me,
Que tudo isso é pensamento,
Que não senti afinal.

Temos, todos que vivemos,
Uma vida que é vivida
E outra vida que é pensada,
E a única vida que temos
É essa que é dividida
Entre a verdadeira e a errada.

Qual porém é a verdadeira
E qual errada, ninguém
Nos saberá explicar;
E vivemos de maneira
Que a vida que a gente tem
É a que tem que pensar.

Fernando Pessoa

terça-feira, 23 de outubro de 2007

#

pffff.....

segunda-feira, 22 de outubro de 2007

.








































(no fundo, no fundo, muitas vezes era isto que queria. Silêncio no fundo do tempo...)

domingo, 21 de outubro de 2007

Pegadas

Fins de tarde e principios de manhã, sitios diferentes, gentes diferentes, mundos diferentes, tempos diferentes e o resto. Qual resto? Esta coisa do resto que tanta confusão me faz. Duas ou três camadas abaixo lá está a tal coisa, o tal resto qual espécie de miolo escondido mas quase tão igual.

Os actos e as palavras mais os gestos e os sentimentos e os medos e tudo isto somado à pressa numa conta de resultado estranho. As canções também por lá andam, mais as notas e as emoções e tudo o mais que possam levar atrás.

E no fundo, no fundo, sinto que já nem sei bem o que digo ou do que falo, sei que sim. É tudo o que sei.

Vidro

Como um vidro imenso, a distância que separa e faz doer. Meia duzia de metros ou mais alguns quilómetros, sempre tão perto e tão longe ao mesmo tempo. E depois olhar para dentro do aquário gigante e ver os peixes e ter vontade de lhes tocar e não ser possível passar do vidro. O vidro, o tal vidro que marca a distância mesmo que aparentemente ela não exista.

O ali já aqui, a incompreensão nas caras de quem não entende o que é viver numa espécie de trapézio sempre a balançar de um lado para outro, de um mundo para outro, mas de balanço em balanço perde-se sempre um pouco de algo no ar. Um pouco de tudo em todo o lado, sempre um pouco, raras são as vezes em que posso ser um eu só. O estar, sem estar a pensar noutra qualquer coisa.

Vou vendo o mundo, outros mundos, cá de cima enquanto aprecio a paisagem, sei que sei o que quero e como quero, sei o mundo onde o quero. Sei tudo isto, agora basta ir. Como?

#

Mais um que chega, vejo a cara, olho os olhos, meço as formas e conto uma história. Centenas de vidas as passar por mim, felizes, infelizes, nada disso ou talvez tudo ao mesmo tempo.

Porque...

Porque os outros se mascaram mas tu não
Porque os outros usam a virtude
Para comprar o que não tem perdão.
Porque os outros têm medo mas tu não.
Porque os outros são os túmulos caiados
Onde germina calada a podridão.
Porque os outros se calam mas tu não.

Porque os outros se compram e se vendem
E os seus gestos dão sempre dividendo.
Porque os outros são hábeis mas tu não.

Porque os outros vão à sombra dos abrigos
E tu vais de mãos dadas com os perigos.
Porque os outros calculam mas tu não.

Sophia de Mello Breyner Andresen

...

"Lá em baixo ainda anda gente
apesar de ser tão tarde
há quem cresça no escuro
e do dia se resguarde
há quem corra sem ter braços
para os braços que os aceitam
e seus braços juntos crescem
e entrelaçados se deitam
e a manhã traz outros braços
também juntos de outra forma
de quem luta e ao lutar
a si mesmo se transforma

E tu Maria diz-me onde andas tu
qual de nós faltou hoje ao rendez-vous
qual de nós viu a noite
até ser já quase de dia
é tarde, Maria
toda a gente passou horas
em que andou desencontrado
como à espera do comboio
na paragem do autocarro"

Sérgio Godinho, Lá em baixo

Girar, girar, girar...

sexta-feira, 19 de outubro de 2007

Facto

O mar é muito mais que milhões de gotas de água, sais e lixo.

Wallpaper

#9

As fábricas existem. Há fábricas de TUDO!

Casa(s)

Estão as paredes e as pedras, os pilares, as mesas e o resto da mobilia. Está o chão e o tecto, está a porta ao fundo, o canto escondido, está tudo, mas a casa está vazia de gente apesar de por lá vaguearem algumas almas.

Paro um pouco para pensar enquanto fecho os olhos e converso em surdina com os fantasmas que vão aparecendo para me cumprmentar. Vão entrando, tantos, tantos. Trazem sorrisos e canções, trazem alegria no olhar mas não são mais que imagens da mente, fantasmas numa casa deserta.

As casas não são feitas de paredes mas sim de pessoas.

terça-feira, 16 de outubro de 2007

Horas

Gostava de poder voar nos dias em que o ar parece leve e se ouvem sons ao longe. Gostava de poder partir em dias que são noites. Gostava que os comboios não tivessem horários nem linhas pré-definidas. Gostava de ter estado. Vou estar, não ontem mas um dia.

segunda-feira, 15 de outubro de 2007

Birkenau


O mundo não pára e enquanto anda muitos gostavam que voltasse atrás. Atrás pensam uns, agora dirão outros. Imagens que despertam a mente. Nunca mais? E hoje, noutra qualquer parte do mundo, não se passa o mesmo?

E depois há quem se queixe por acordar cedo e grite bem alto que a vida é fodida. Pois...

sábado, 13 de outubro de 2007

Pedras

Pego no tempo, meto-o na palma da mão e olho bem para ele. Espero, espero a ver se foge. Espero, mas não foge, nem corre, nem tão pouco dá sinal de lá estar. Atiro-o ao ar a ver se desperta. Abano-o, amasso-o. Não se mexe. Não reage. Terá morrido? O tempo morto na minha mão e as pedras ali à frente da espécie de praça que é mais um largo por ser algo pequeno demais mas que eu teimo em chamar praça.

E depois os passos de sempre mais o caminho do costume como que a matar a rotina dos dias vulgares nos dias estranhos em que posso olhar para a palma da mão e apreciar as feições do morto por entre palavras e mundos daqui e de outro qualquer lado.

Há pedras no chão, há pedras à beira-mar, há muitas perdas e pedras para encontrar.

E se...

E se as nuvens fossem de algodão doce e só fosse preciso atirar um qualquer pau ao ar para poder saborear um pouco delas? E se lhes pudessemos atar um pouco de fio para trazer uma sempre atrás? E se um chuveiro fosse nada mais que uma nuvem pequena? E se as pontes fossem todas de madeira para estarem sempre em manutenção e não darmos por adquirido o facto de haver ali algo para atravessar o rio? E se as vacas ganhassem asas de papel e pudessem voar em direcção ao sul porque não queriam encontrar o norte? E se isto tudo pudesse existir em quem não é capaz de olhar para lá do que vê?

Protótipo


(click it)

75%

Quem diria...

terça-feira, 9 de outubro de 2007

Não existes!

Lá voltaste a puxar para ti o lençol
Como que a privar meus sonhos do último raio de sol
Amigos são sobras do tempo
Que enrolam seu tempo á espera de ver
O que não existe acontecer

Mas teimas em riscar o fim do meu chão
Nunca medes a distância
Dos passos á razão
Meus votos são claros na forma
Desejo-te o mesmo que guardo p'ra mim
E o que não existe não tem fim

É só dizer e volto a mergulhar
Voltar a ler não é morrer é procurar
Não vai doer mais do que andar assim a fugir
Deixa-te entrar para tentar ou destruir

Mas quem te ouviu falar
Pensou tudo vai bem
Só que alguém vestiu a pele
Que nunca serve a ninguém
E a dúvida está do meu lado
Mas eu não consigo olhá-la e achar
Ser esse o lado em que ela deve estar

Erguemos um grande castelo
Mas não nos lembramos bem para quê
E é essa a verdade que se vê

É só dizer e volto a mergulhar
Voltar a ler não é morrer é procurar
Não vai doer mais do que andar assim a fugir
Deixa-te entrar para tentar ou destruir
Mas sem fingir
Sem fingir
Sem desistir

Manel Cruz, Amigos de quem

Poderiam lá ser...

De cá para acolá, sim, não, talvez. As sobras não são restos estragados, pelo menos as do tempo.

?

E depois o mundo dá tanta volta que já ninguém sabe bem que é e poucos sabem quem ou o que são os outros. Esquecem-se as definições de dicionário e a familia passa a ser feita de pessoas que não partilham o nosso sangue. Chega depois a altura em que se pergunta até o que é isso.

Ligados, mais uma vez ligados a seres, não porque alguma vez o tenhamos querido, mas sim porque assim vamos nascendo e sendo presos por nós a que somos alheios. Virá o dia em que será preciso olhar e perceber o que é aquilo tudo que não fizemos. Quem são aqueles que nos são próximos sem que alguma vez se tenham aproximado, sem que nos tenhamos aproximado, serão mesmo próximos?

Hoje deixei de ter familia. Tenho mais que isso espalhado por ai e aqui ao lado. Familia não mais. Gente, gentes é o que tenho, amigos também.

domingo, 7 de outubro de 2007

A foto que não encontrei para pôr aqui

(gajo que veste uma t-shirt amarela, com uma imagem daqueles touros pretos que se costuma ver por Espanha, estampada)

Elephant, elephant, elephant...

Maçãs

Maçãs bonitas no hipermercado. Brilhantes, bom ar, fazem crescer água na boca de tão saborosas que parecem. Uma trinca, duas, três, pergunta a lingua onde está o sabor, onde está a maçã. Papa, só uma papa que se desfaz na boca, quase sem sabor, quase que não é maçã. Não deve ser aliás, é mais uma outra qualquer coisa que teimaram em formatar sem se lembrarem que poderia desaparecer algo. Desapareceu o sabor e o sentir da polpa, desapareceu o trincar devagar, foi-se a maçã.

Maçãs feias numa qualquer árvore, baças, algumas mesmo com bicho. Não falam como as outras, não gritam ao estômago pelos olhos. Limitam-se a estar. Até ao dia em que se pega numa e volta o gosto à boca. Maçãs sumarentas e doces, maçãs que se podem trincar e saborear. A primeira impressão logo posta de lado, afinal o que não parecia grande coisa revela-se algo mais.

As pessoas são como as maçãs. Hoje são.

sábado, 6 de outubro de 2007

E depois?

E depois quando é preciso contar uma história não há ninguém capaz de a ouvir. Pode haver vontade, sim, mas ser capaz é diferente de querer...

Para ser capaz é preciso entender e para entender é preciso conhecer. E nunca é fácil conhecer o que não se quer, quanto mais o que não se pode. Gostava de contar uma história, gostava de ter quem a pudesse entender, não tenho, não conto. Mas gostava.

Até já a tentei escrever, mas o papel não faz perguntas e sem perguntas tudo se torna simples demais. Achei maneira de a contar, mas assim também não o quero. Uma linha aqui, outra acolá, uma frase em cada lado, impossíveis de juntar, mas fáceis de entender, mas simples não tem de ser fácil e assim também não faria grande sentido.

Guardo-a então para mim, para a contar a mim mesmo em dias em que não tenho sono nem vontade de sair da cama pela manhã. Pena ainda não saber o fim...

#

"A terra é grande
é pequenina
do tamanho apenas da tangerina
quem mata e morre
nunca percorre
os caminhos do que há de melhor
nesse sumo
a vida, gomo a gomo"

Sérgio Godinho, O Primeiro Gomo da Tangerina

quarta-feira, 3 de outubro de 2007

Um palhaço

É tarde para alguns, cedo para outros. Passam corpos de caras cansadas e olhares baixos. Chove, ao longe o palhaço chora. Sabe que pode chorar à vontade em dias de chuva que ninguém vê o sal das lágrimas, só gotas de água iguais às que vão caindo do céu. Derrete a máscara, mais tarde mudará de roupa. Trocará depois os balões e apitos por uma qualquer canção melancólica que não deixa de acompanhar com os lábios. Dois pontapés numa pedra, dois copos na tasca, hoje não é mais palhaço. O seu circo voltará a abrir amanhã.

terça-feira, 2 de outubro de 2007

Manta

Nem orgulho nem saudade, muito menos nostalgia. O ponto a que se chega, o mundo que se vê, os panos rasgados, juntos numa manta de retalhos mesmo assim cheia de buracos, uma manta cosida com linha ora (cá está ela) grossa ora fina, pedaços de panos grandes, outros mais pequenos, todos juntos, cosidos e por momentos amassados quando pego nela e a levo debaixo do braço. Uma manta que se faz bola, bola redonda como o mundo, o meu mundo numa manta de gente. A minha manta tem no entanto uns retalhos especiais, diferentes dos outros, mais sujos e por isso mais brilhantes, pode ela rasgar-se toda que pelo menos aquele quadrado de tecido amarelo hei-de guardar para sempre no bolso.

Ora...

Gosto da palavra, ora, ora, ora. Leva-me sempre para a mesma frase e daí para outras tantas. "Ora amarga, ora doce...". Daí à tangerina é um pulo. Contradições numa palavra, ora.

Pace!

Não entendo como há coisas que não ficam para sempre de tão boas que são. A paz. Porque é que não há sempre esta paz que agora sinto, porque foge ela? Hoje está e não sei até quando. Sei onde nasce, aí, mesmo ao lado da fonte dos sorrisos.