segunda-feira, 31 de agosto de 2009

Medidas

"uma aldeia tem o exacto tamanho do mundo para quem sempre nela viveu"
José Saramago

sábado, 29 de agosto de 2009

Cento e treze

da diferença que faz uma letra a seguir ao nome de uma doença vulgar

"Para toda essa gente, que representa a grande massa do povo, a influência da imprensa é fantástica. Eles não estão em condições, por falta de cultura ou por não o quererem, de examinar as ideias que se lhes apresentam. Assim, a maneira de encarar os problemas do dia é quase sempre resultado da influência das ideias que lhes vêm de fora."

quinta-feira, 27 de agosto de 2009

O medo vai ter tudo
pernas
ambulâncias
e o luxo blindado
de alguns automóveis

Vai ter olhos onde ninguém o veja
mãozinhas cautelosas
enredos quase inocentes
ouvidos não só nas paredes
mas também no chão
no teto
no murmúrio dos esgotos
e talvez até (cautela!)
ouvidos nos teus ouvidos

O medo vai ter tudo
fantasmas na ópera
sessões contínuas de espiritismo
milagres
cortejos
frases corajosas
meninas exemplares
seguras casas de penhor
maliciosas casas de passe
conferências várias
congressos muitos
óptimos empregos
poemas originais
e poemas como este
projectos altamente porcos
heróis
(o medo vai ter heróis!)
costureiras reais e irreais
operários
(assim assim)
escriturários
(muitos)
intelectuais
(o que se sabe)
a tua voz talvez
talvez a minha
com a certeza a deles

Vai ter capitais
países
suspeitas como toda a gente
muitíssimos amigos
beijos
namorados esverdeados
amantes silenciosos
ardentes
e angustiados

Ah o medo vai ter tudo
tudo
(Penso no que o medo vai ter
e tenho medo
que é justamente
o que o medo quer)

O medo vai ter tudo
quase tudo
e cada um por seu caminho
havemos todos de chegar
quase todos
a ratos

Sim
a ratos

Alexandre O'Neill, Poema Pouco Original do Medo



domingo, 23 de agosto de 2009

da lanterna azul

As coisas nunca são o que são. A cada segundo deixam de o ser para depois se tornarem noutro algo qualquer. Como as ondas que batem na areia da praia. O centro do mundo era um lugar abstracto e sem nome. Agora[até quando?] o centro do mundo é um lugar pequeno e não muito lindo embora já tenha nome e cor e cheiro. Bratislava e a estação podre e velha e os pedintes e os panados oleosos e as sandes de frango com sabor a nada e um homem mal encarado a fazer de polícia e os aviões ali ao lado e centopeias quase gigantes e a barriga apertada por borboletas invisiveis e os abraços mais fortes que o fio com que um dia vi uma aranha pendurada no tecto. Depois há aquela coisa de ninguém estar bem com o que tem e estar sempre à espera do que há-de vir, a pensar no que já passou. Está tudo escrito nos livros e cantado nas canções, é só preciso ter olhos para ler e ouvidos para ouvir se bem que há quem leia sem ver e consiga perceber as palavras que te saem da boca sem que um único som se forme algures no cérebro. Adiante, há quem se junte em largos para ver vacas a arder, há quem prefira ver o sol arder, outros ainda gozam mais com pinheiros e eucaliptos. Gostos não se discutem. Mas resta sempre aquele fascínio pelo fogo nem que seja fogo colorido no céu escuro, ou então o outro que nem cor tem[pelo menos enquanto as mãos não rebentam] mas faz pum-pum-pum para alegria de todos[ou quase]. Pum-pum-pum, podia ser pão pão pão para alguém que o não tem, mas festa é festa e isto não pode acabar e afinal para um pão não há quem não tenha dinheiro, excepto quem o não tem, claro está. Agosto é um mês fodido. Mais uma vez aquilo das coisas mudarem a cada tic-tac. Agosto já foi diferente no tempo em que os dias corriam depressa e cheiravam a sardinha assada à hora de almoço. E depois havia sempre um dia[ou dois, ou três] em que o mar se achava maior e fazia os barcos de borracha andar pelas ruas e isto era sempre assim, certo. Era. Hoje ao almoço houve gripe A, a derrota do sporting[pena] e cancro[mais um], a Naíde está agora a saltar[todos sabemos que é boa mas há sempre a coisa da necessidade da medalha], logo à noite joga o benfica e por breves minutos o país entrará naquele estado de semi-hipnose-crónica[afinal há coisas que continuam iguais]. Falta só dizer que o mundo irá acabar a uma sexta-feira[juraram-mo a pés juntos], embora ainda não se saiba bem qual. Há coisas que só se descobrem com um pouco de atenção.

quinta-feira, 20 de agosto de 2009

(alindar)



Enquanto as palavras não aparecem. Das mãos a arder em sangue às lágrimas perdidas na viagem diferente de todas as outras. Eis tudo!
(os lábios molhados a sal. brno-bratislava. era tudo quase simples e tu a chegar. era tudo quase simples e borboletas na barriga. era tudo quase simples e tu a chegar. tu a chegar...)

sexta-feira, 7 de agosto de 2009

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pouco mais de uma hora e a mesma pergunta repetida a cada porta. pouco mais de uma hora duas vezes. o cheiro a ferro e o cheiro a mar. os passos rumo ao nada. a resposta curta. simples. dantes.