domingo, 31 de agosto de 2008

Quase domingo

Faz calor. Não há gente na rua. Fora dela talvez haja, mas hoje não encontrei. Um cão que ladra, deve ter fome.

Achei um fragmento de espelho partido em cima de um muro. Peguei-lhe por curiosidade. Apesar de pequeno dava ainda para ver alguma coisa reflectida. Digo a mim mesmo que devia usar aqueles que tenho em casa mais vezes. Esqueço-me sempre...

Moedinhas para a máquina e no fim do mês são só duzentos euros em cigarros. Golo do benfica e esta noite já não se dorme tão mal.

Na televisão oferecem dinheiro às três da manhã. Para quê tanto assalto?

#25

E nos domingos em que pouco havia para fazer, quando longe de corpo, demoravam-se horas por detrás de uma linha e dois telefones. Quando perto, a história era sempre a mesma. Mas havia café quente, sorrisos...

quinta-feira, 28 de agosto de 2008

Chaga:

do Lat. plaga

s. f.,
ferida aberta;
úlcera;
incisão na casca das árvores;

fig.,
desgraça;
mal;
coisa que faz pena;

fam.,
pessoa importuna, desajeitada;

Bot.,
(no pl. ) planta trepadeira tropeolácea ou a sua flor.

quarta-feira, 27 de agosto de 2008

Lost in translation

Pois os objectos são só isso e o que se faz com eles cada qual há-de saber. Faca abre-latas, arame chave, caneta garfo, copo arma...

Tudo faz mais sentido assim. Ou quase.

terça-feira, 26 de agosto de 2008

#24

Lembro-me como se tivesse sido ontem, ou esta tarde até. Milhares de ingleses à minha volta... As tais bestas eram afinal pessoas mais que vulgares. Pessoas mais que vulgares que numa bola viam, talvez, um sonho. E as bestas cantavam e saltavam. E gritavam, e transpiravam fé e vontade. E eram. Naqueles poucos minutos eram uma outra coisa.

Noventa minutos, dois apitos e tudo voltou ao começo As vozes transformaram-se em corpos. Velhos e novos, homens e mulheres...

Muitos foram os jogos que vi depois desse, quilómetros de estádios, mas não mais voltei a sentir o calor como naquele dia. Tudo passou a saber a pouco quando antes sabia tão bem.

domingo, 24 de agosto de 2008

Planeta estrela

Cimo das escadas. Faz frio. Há estrelas. Há uma luz vermelha lá no alto e grilos que se fazem ouvir (a lua também se vê nos dias em que não se esconde por detrás das casas mal plantadas à volta.).

Passam aviões com mil e uma pessoas divididas entre latas. Três luzinhas por par de asas. Tão pequeninas lá em cima... E se por acaso um dia as luzinhas se apagarem enquanto lhes sigo o rasto?

É assim que acontece quando as estrelas caem (as estrelas não caem mas assim soa melhor, há até quem não acredite em meteoritos...). Um pontinho de luz aparece do nada, cai, cai, cai (ou flutua, ou vagueia, sei lá...) e pronto. Pedes um desejo e agora é so esperar que aconteça (tenta pedir que o sol apareça de manhã para ver se resulta mesmo...).

E o que são os anos para a pedra que deixou de o ser? Isto do tempo é tão relativo...

Entretanto as luzes continuam acesas lá em cima.

De manhã o sol dá-te um pouco de claridade e a história do desejo é mesmo verdadeira (para a próxima pede o fim da fome em Lisboa...). Acordas, vês a luz e vais à tua vida. Algures noutro lado do mundo mais três luzinhas chegam ao chão (explodirão agora?) e ali, ao pé de tua casa, há quem afunde a cabeça num caixote do lixo à procura do pequeno almoço (pão da noite anterior e doce de morango com validade de anteontem. Nada mau. Ontem só havia bananas.).

Três portas abertas. Três luzes apagadas. Três lanços de escadas. Mais um dia...

Pode ser que hoje seja diferente. Pode ser que a lua se pinte de roxo e as estrelas apareçam verdes. Pode ser que o mar cuspa os peixes e volte a nascer mais um salvador (tantos Jesus na América do Sul...). E se todas as máscaras fossem queimadas no meio da praça?

Pode ser que sim...

Ou então resta-nos ser daltónicos à força e sonhadores de olhos abertos...

"e há quem imite os lobos embora imitando gente "


[minuto 5]

Tantos inteligentes, tantos, tantos...

quinta-feira, 21 de agosto de 2008

Estória

de manhã espreguiçava-se devagarinho




depois ia à praia apanhar ouriços e estrelas do mar

terça-feira, 19 de agosto de 2008

Sinapse

Uma prisão nos olhos. Duas prisões. Quatro olhos. Grades fracas queimadas pelo arder de um cigarro que não há. Como putos de doze anos a fugir dos olhos -mais uma vez os olhos- pequenos das coisas não muito grandes que se nos vão atravessando à frente (e passando ao lado. e ficando para trás.)

O resto é rir enquanto se espreita pela fresta da porta mal fechada. Rir, partir e voltar quando menos se espera só para um abraço tonto e sem sentido aos olhos que servem só para olhar e não para ver.

Saltam as palavras com vida própria e a Força ganha outro sentido. Mais um par de sorrisos. Adeus? Não pode haver... Estamos sempre lá, sempre cá, sentados no muro de lugar que não existe. Lugar nosso, lugar nenhum, com vista para o que se quer ver.

segunda-feira, 18 de agosto de 2008

Linha

"Mas é sempre a mesma história
Depois do primeiro assombro
Logo o corpo fica farto"

Sérgio Godinho, Balada da Rita

sexta-feira, 15 de agosto de 2008

Haver

Como se tudo na vida fossem comboios movidos a vento...

Sem plano e sem vida. Sem hora nem rumo. Só a linha e o relógio de estação a marcar as horas no tic-tac do costume. O tic-tac que varia o ritmo consoante a pressa de quem corre e a serenidade de quem aguarda sem certeza nem medo.

É tão possível morrer debaixo de um relógio de estação. Deve ser pesado. Estás ali à espera e de repente caem-te as todas as horas em cima...

Mosquitos, árvores e chuva. Algodão doce também...

Mais uma rajada de vento e agora impera o avesso. O lugar nascido na rua sem gente. Porta pequena e a casa de sempre... A casa noutra cidade. Fotócopia surreal... Não muda sequer a mobilia, nem o caixote do lixo com o caroço de maçã apodrecido pelo esquecimento.

Dá para sorrir. Na rua dançam as bandeiras. É hora de partir outra vez.

quinta-feira, 14 de agosto de 2008

Porque nunca se pode ter tudo

e falta sempre qualquer coisa. Mesmo que haja a cereja no topo do bolo lindo lindo lindo. Esqueceram-se do açúcar... E o bolo amarga...

Desta vez faltou o último adeus.

Ou então não faltou e só não se ouviu...

segunda-feira, 11 de agosto de 2008

vidro

sim sim senhor razão diga lá mais uma vez...

diga lá, o senhor que sabe tudo, desde a mais bela táctica para ganhar no futebol, até à melhor maneira de depenar estorninhos malhados, passando ainda pelo conhecimento de mecânica aliado a um pouco de física e, já agora previsão meteorológica só com um pouquinho de cuspo no dedo...

diga lá senhor sabão o que é um padrão e um telefone. explique por favor às criancinhas porque é que o mar é azul e o céu salgado... é ao contrário? pouco importa, o senhor consegue na mesma...

conte lá onde se compra o arroz mais barato e qual é o melhor sitio para sair à noite. fale, fale sem parar. não se faça modesto...

pum, pum, pum! fogo de artificio verbal... e os planos da vida do outro. desenhe já no papelinho amarelado, faça-lhe o mapa, ensine-lhe o caminho.

aproveite senhor juiz, alguém errou. julgue, julgue já. ainda há cordas na loja e não falta quem saiba fazer um belo nó de forca. julgue e condene, que matar não custa. não tenha medo, não é preciso matar o corpo, só o resto...

e depois meu senhor, dono da razão do saber e da verdade, quando o longo dia chegar ao fim, tente arranjar um espelho. pode ser que então o sono tarde.

domingo, 10 de agosto de 2008

Sumo de Limão

E são tantas as metáforas e as analogias, mais que muitas. Surgem do nada, talvez venham com o vento... Mas todas redundam. É como a história do hamster e da roda.

Resta uma certeza simples...

Sol

De um lado, o sol queima as palavras, do outro, seca as ideias. O mesmo sol que é bom de ver por entre as folhas das árvores e que convida ao torpor. O sol que gira sempre sem parar. E depois sobra pouco para dizer quando as palavras não surgem...

sábado, 9 de agosto de 2008

Momento

Tenho a perna dormente e há um desconforto enorme em tudo isto.

quinta-feira, 7 de agosto de 2008

Manhã


e depois acordar na areia e não saber se a conversa existiu ou foi um só mais um sonho...

quarta-feira, 6 de agosto de 2008

#

"e dizem e falam, falam demais sabes? farto-me de as ouvir... porque depois pensam assim e assim mesmo e eu estou-me bem a cagar se os putos comeram a papa ou não. uma ilusão... tudo não passa disso. porque depois no fundo sinto-me a andar às voltas como os hamsters sabes? ando e ando mas acabo por nunca sair do lugar. e depois não sei porque já não tenho a certeza de nada. só os fantasmas, sempre os fantasmas atrás de mim. por mais que mude, por mais que fuja eles simplesmente não me largam. e aqui estou a dar voltinhas na roda... às vezes penso em saltar, mas é impossível fugir..."

sexta-feira, 1 de agosto de 2008

(...)


"And if the dam breaks open many years too soon
And if there is no room upon the hill
And if your head explodes with dark forbodings too
I'll see you on the dark side of the moon"

Pink Floyd, Brain Damage

segunda-feira, 28 de julho de 2008

Vozes

Disseram no outro dia que éramos iguais. Fiz de conta que não ouvi.

Depois pensei nas palavras e nos metros e nas pedras e nas varandas e nas viagens e nos comboios e nas pistas e nos carros e nos silêncios e nas horas perdidas a fazer nada.

Olhei-os de lado e ri-me contigo.

#23

- Não sentes, às vezes que isto não é teu? Que te limitas a ir andando e que por mais que faças acabas sempre parado no mesmo sitio....
- ...
- É como a história do hamster, que anda ali às voltas na roda. Anda, anda, anda, mas nunca dali sai. Sinto isso, sabes? Como se houvesse qualquer coisa a controlar-nos...

domingo, 27 de julho de 2008

Nadas...

No dia triste o meu coração mais triste que o dia...
Obrigações morais e civis?
Complexidade de deveres, de conseqüências?
Não, nada...
O dia triste, a pouca vontade para tudo...
Nada...

Outros viajam (também viajei), outros estão ao sol
(Também estive ao sol, ou supus que estive).
Todos têm razão, ou vida, ou ignorância simétrica,
Vaidade, alegria e sociabilidade,
E emigram para voltar, ou para não voltar,
Em navios que os transportam simplesmente.
Não sentem o que há de morte em toda a partida,
De mistério em toda a chegada,
De horrível em todo o novo...

Não sentem: por isso são deputados e financeiros,
Dançam e são empregados no comércio,
Vão a todos os teatros e conhecem gente...
Não sentem: para que haveriam de sentir?

Gado vestido dos currais dos Deuses,
Deixá-lo passar engrinaldado para o sacrifício
Sob o sol, álacre, vivo, contente de sentir-se...
Deixai-o passar, mas ai, vou com ele sem grinalda
Para o mesmo destino!
Vou com ele sem o sol que sinto, sem a vida que tenho,
Vou com ele sem desconhecer...

No dia triste o meu coração mais triste que o dia...
No dia triste todos os dias...
No dia tão triste...

Álvaro de Campos

segunda-feira, 21 de julho de 2008

Jardim

Num canto, girassóis, no outro uma roseira. Uma grande árvore no meio, daquelas que se não abraçam de uma vez só. Alguma relva, um banco verde e pedras com vista para o rio.

Enterrada na terra está uma caixa. Folhas e mais folhas. Brancas e lápis coloridos. Pendurado na árvore, um arco-íris pintado a mil cores num dia em que choveu miudinho.

Olhando de baixo, a árvore desenha-se núvem e dos ramos pende um pequeno trapézio que baloiça ao sabor do vento. Lá, no sitio onde não há tempo e o ar não sufoca nunca.

"Não vês que é de nós o jardim..."

#

Vagarosamente, como se aquele copo de leite quente agora já quase frio fosse toda a sua vida. Nem hoje, nem amanhã. Tudo o que pode existir no universo condensado na nata que se ia colando à colher ja tonta de tanta volta dada em torno do vidro grosso.

Cega, talvez, ou só de olhar preso ao infinito da parede meio suja. Ou então a parede já não era parede e sim um qualquer espelho da alma. Chorou em poucos minutos todas as lágrimas que em si cabiam.

Tirou do bolso o lenço amarrotado e limpou o que restava dos olhos feitos cascata. Do mesmo bolso tirou também a moeda que abandonou em cima da mesa. Deixou o leite, deixou o lenço. Encontrou numa cara à sua frente um sorriso, pegou nele e foi embora. Bateu com a porta, partiu o vidro, riu e correu.

Sintonia

Sem aviso, nem hora, nem cigarro.

sábado, 19 de julho de 2008

-



















..

domingo, 13 de julho de 2008

Cancro

Cancro de merda!

"Ah e tal, tens dois meses de vida...".

Claro que a morte é certa -sempre o foi para todos-, mas nunca o quiseste ver, nunca quiseste saber... E então, é agora, durante dois meses que vais aprender a cheirar uma flor? É agora que vais saber o que vale um "Bom dia!" e um sorriso? E a ver nascer o sol pela janela fosca do hospital mal cheiroso e quente.

Quando podias, não cheiraste, nem disseste, nem viste. Não o quiseste sequer, quanto mais tentar. Anos e anos que tiveste para... E agora em dois meses queres isso tudo. Agora que tens o sangue podre e te começam a cair os dentes arrancados por rios de baba.

Gostavas agora de dizer umas palavrinhas a alguém mas também não podes. Afinal, esse alguém não existe. Ou se existe, só existe para ti... Como lhe podes tu pedir uma visita? Podias telefonar, mas como poderias falar sem que te ouçam pelas paredes orelhudas? Podias também escrever, mas bem sabes que te iriam abrir a carta. Desesperas...

Ficas então calado com as palavras em ti. Belo castigo... Nem tudo é mau, vendo bem, só vai durar dois meses.

Dois meses passaram, e do outro lado, enquanto saceias mais um bichinho, há quem abra a caixa do correio todos os dias... "Bem que podia dizer alguma coisa..."

sábado, 12 de julho de 2008

Metáfora


Passaram quatro anos.

sexta-feira, 11 de julho de 2008

Há quem seja até mais que...

Quase chove. Cheira a terra, o ar. Olho à volta e vejo ninguém. Afinal a chuva quase molha e debaixo dos montes de betão e ferro não entram as leves gotas de água.

Sigo enquanto sinto. Soubessem eles o que perdem... Gente? Não creio!

quarta-feira, 9 de julho de 2008

I already have ten thousand spoons...



"And for a minute there, I lost myself, I lost myself"
Radiohead, "Knives Out"

segunda-feira, 7 de julho de 2008

#22

Começo a conhecer-me. Não existo.
Sou o intervalo entre o que desejo ser e os outros me fizeram,
Ou metade desse intervalo, porque também há vida...
Sou isso, enfim...
Apague a luz, feche a porta e deixe de ter barulhos de chinelos no corredor.
Fique eu no quarto só com o grande sossego de mim mesmo.
É um universo barato.

Álvaro de Campos

sábado, 5 de julho de 2008

Arrasto

Uma tira de entremeada pode fazer toda a diferença quando se salta para um lago cheio de crocodilos.

Um passo ao lado da ovelha morta no meio da estrada também pode mudar a história. Tripas de fora, bombas dentro. É a vida, ou a morte... Afinal que mal pode fazer uma ovelha morta? E o pedaço de ferro redondo?

E as nódoas? Não são mais que manchas nas roupas.

("Cuidado, cuidado!!! Estão vidros no chão..."). Também estavam palavras no ar...

quinta-feira, 3 de julho de 2008

4+4=8

Azul
Núvem
Céu
Rio
Mar

Algodão
Mel
Sorriso
Rasto

Fundo
Salta
Cai
Foge
Roda
Gira
Volta

Vento
Varanda
Flores

Luz e frio, vozes e caras, passos lentos que se arrastam vagarosos pelo chão e a erosão dos passos lentos que se arrastam pelo chão a deixar rasto no trilho que se forma pelos mosaicos já meio amarelados por tantas vidas que os calcaram...

Os olhos não vêm, olham. O coração não sente, bate. Os corpos não vão, seguem. Os ouvidos não escutam, ouvem.

tic-tac, tic-tac, tic-tac, tic-tac, tic-tac, tic-tac, tic-tac, tic-tac, tic-tac, tic-tac, tic-tac, tic-tac, tic-tac, tic-tac, tic-tac, tic-tac, tic-tac, tic-tac, tic-tac, tic-tac, tic-tac, tic-tac, tic-tac, tic-tac, tic-tac, tic-tac, tic-tac, tit-tac, tic-tac, tic-tac, .......................................

Flight lesson #1: Have you ever seen a chicken flying? Chickens have wings...

E é tudo tão mais simples quando uma simples frase se apodera da mente... "Basta querer.". E acabam as distâncias e as agendas e as horas e o resto. Porque sim! E os comboios são nossos escravos mesmo que a viagem se faça em vão... Mas nunca é em vão. Resta sempre qualquer coisa, quanto mais não seja uma dúzia de olhos gritando a uma só voz a palavra que não mais abandonará o ser.

8X10=80

#21

Sem pressa, cai o sol no mar deixando para trás um rasto de mel. Deve ser doce o rasto do sol. É por isso que alguns julgam que as nuvens não são mais que algodão doce a flutuar no céu...

Pode lá ser isso possível, se o algodão...

sábado, 28 de junho de 2008

(...)


Pecados mil
Cem prazeres vãos
Tenho bolhas nos dedos
Tenho calos nas mãos é ele que me chama
Se o bem corre perigo
Ou eu acabo com este
Ou este acaba comigo
Não
Não
Não posso ser eu
Não
Não
Não me deixam ser eu
Mas então
Quem é que eu vou ser?
Quero uma última vontade antes de nascer!...
Quero ser pouco
Ou quero ser rouco
Ou um pedaço de merda
Quer ser um pouco de gente
Eu imploro
Quero ser igual…
Depois das lágrimas
Do arrependimento
Surge a raiva que a não leve o vento! Mas eu sei cantar
Da minha maneira
E pelo que eu creio
Canto a noite inteira Mas eu sou bom
Eu perdoo tudo
Por vontade deles
Eu seria mudo
Quero ser muito
Quero ser tudo
Estar só
É tudo o que eu quero
Agora…

Manel Cruz, "Eu"

quinta-feira, 26 de junho de 2008

Rádio

É quente a tua mão, ainda mais que leve. E faz-me falta nos dias em que quase chove e nas noites sem sono e nas tardes de sol e nas viagens sem destino. Porque há canções simples que continuam a fazer-se ouvir. Porque sim!

quarta-feira, 25 de junho de 2008

Janela


Porque a(s) vida(s) não tem(êm) que ser sempre cinzenta(s)...

terça-feira, 24 de junho de 2008

Morfina

Há quem se esvaia em sangue, há quem perca pedaços de si em dias que de bom pouco têm. Depois sobra o vazio e o espaço onde já ouve um bocado de perna e um pé.

E sobra tempo no branco. Paredes brancas, batas brancas, ideias em branco.

E se...?

Cordas

sábado, 21 de junho de 2008

Ouvi dizer

Ouvi dizer que para lá do azul do céu, por cima das núvens, mesmo ao lado da fábrica de impossíveis há um velhote que passa os dias sentados a matar o tempo. Uns pózinhos mágicos e as horas passam ao ritmo do algodão doce que vai tomando forma em volta do pau. Algodão doce, como os sorrisos. Ainda me lembro do tempo em que os sorrisos eram de algodão, do tempo em que trazias doces na mão... Ainda me lembro.

Ouvi dizer que lá longe as paredes são de vidro, como muitos dos tectos cá em baixo, e nos dias em que a luz do sol brilha forte demais, os vidros transformam-se em espelhos, espelhos daqueles que não há cá em baixo, espelhos onde se reflectem as almas abertas por um abraço bem quente.

Ouvi dizer que, depois, nos dias em que chove muidinho se fazem grandes festas, festas quase tão grandes como aquelas dos dias em que chove bem forte, mas mesmo assim pequenas quando comparadas às outras, as que acontecem sempre que cai do céu mais uma estrela em mil pedacinhos de luz incandescente.

Ouvi dizer que as ruas vão todas dar a uma grande praça e que a praça fica de frente para o mar e que, lá longe, o mundo tem um girar diferente. Então o sol nasce no mesmo sitio onde se pôe. E todas as semanas há um dia em que o sol se limita a não aparecer, como aqui acontece com a lua. Diz-se por lá que às vezes é preciso sentir falta, para dar valor...

Gostava de lá ir um destes dias. Hoje as portas já fecharam. Ouvi também dizer que o mundo acaba amanhã...

quarta-feira, 18 de junho de 2008

Já deu

Em tons de amarelo, toca já quase velha canção, "Yellow", "look how they shine for...".

E já há lua e estrelas e céu. Ainda há um par de dias caía a chuva e as folhas com ela. Só algumas que as outras lá ficaram penduradas qual guarda chuva gigante...

Na rotunda larga os carros continuam a passar como se nada fosse, passavam há uns anos também, enquanto lá longe em Srebrenica as valas iam ficando um pouco mais cheias de corpos sem gente dentro.

Acabou de nascer uma violeta plantada numa terrina...

Óbvio?

"A lei da gravidade para animais domésticos tem variações que exigem o devido estudo porque, se os bichos caem todos à mesma velocidade - o aceleramento é constante e independente do peso do animal -, já a altitude determina a forma como ele aterra.

Do quarto andar o pior que acontece ao gato é partir a pata da frente ou fender o palato e expirrar um pouco de sangue ao bater com o queixo no chão. Mas, por exemplo, se um bichano cair do primeiro andar ele poderá, incrivelmente, os veterinários confirmam-no, partir a espinha e morrer ou ficar paralítico, o desgraçado, por não ter tempo de se virar por inteiro, o que é estranho, ou por fazer mal as contas e dar meia volta a mais. No entanto, do segundo andar e do quarto andar não lhes acontece nada. O intrigante fenómeno de uma queda mais alta ser menos perigosa levou o Raúl da Casa Azul a postular a seguinte hipótese:

- E se a queda segura de um gato for uma constante de andares de número par?

...

O certo é que um dia o Cubano, farto dos gatos, alterou o seu campo de estudos para os cães. Deixou cair um cãozinho de patas para o ar, do quarto andar para o pátio, e o rafeiro não se virou e morreu.

- Conclusão, cão não é gato.

O animal fez um barulho seco e almofadado, parou de ganir. O medo do cãozinho encheu o ar, nos dois segundos e meio da queda."

Rui Cardoso Martins, "E se eu gostasse muito de morrer"

terça-feira, 17 de junho de 2008

Da cicatriz no braço direito

Os mosquitos picam o corpo em busca de sangue quente. Enquanto isso, a chuva lava almas e ouve palavras perdidas no meio do nada. E as horas passam, assim como os dias e os comboios e as vidas por nós.

"Portugal que com todos estes senhores conseguiu a classificação do país mais atrasado da Europa e de todo o Mundo! O país mais selvagem de todas as Áfricas! O exílio dos degradados e dos indiferentes! A África reclusa dos europeus! O entulho das desvantagens e dos sobejos! Portugal inteiro há-de abrir os olhos um dia - se é que a sua cegueira não é incurável e então gritará comigo, a meu lado, a necessidade que Portugal tem de ser qualquer coisa de asseado!

Morra o Dantas, morra! PIM!"


José de Almada Negreiros, Manifesto Anti-Dantas

segunda-feira, 16 de junho de 2008

d'O Campo

Maior. Do tamanho de um sorriso bem aberto a encher a cara. Maior, sem que se possa medir. Maior. Só assim. Simples? Talvez não seja simples. Talvez tenha sido. Talvez...

Grito agora contra as paredes, contra o vazio. Ecos distantes chegam como resposta. Palavras distorcidas pelo tempo. Tempo-espaço. "Nada se perde, nada se ganha, tudo se transforma", e o pó é só o resto de tudo. Muda a forma, resta a matéria. E no vazio restará também qualquer coisa... Ecos, mais uma vez, ecos de palavras distantes.

Meio metro pode ser longe demais, meio metro entre um copo de água e um corpo de gesso. Meio metro, distância infinita... E depois a dúzia e meia de quilómetros que se transformam em nada. Querer. Porque no mundo é tudo relativo... E do lado de fora isso vê-se muito bem.

Tive em tempos medo do papão e do lobo mau, do sebastião que comia tudo e de ser tostado num forno de lenha. Mas o sebastião não era canibal, o lobo mau gostava mais de chatear ovelhas branquinhas, o papão sentia-se confortável debaixo da cama e no forno apenas cabiam meia dúzia de pães. Sentido? Sim. Fazia.
"quero ver-te amanhecer..."

domingo, 15 de junho de 2008

Tal fosse um copo grande embora sem o fundo

"A rua quebra-me a força negativa.
Sorrir,
Não é pêra doce!"

Ornatos Violeta, Letra S

sexta-feira, 13 de junho de 2008

Sonho?

- Dona Aranha, como vai?
- Como sempre, sob as linhas que teço...
- Não era bem isso...
- Feliz, então, acho.
- É bom saber, Dona Aranha, é bom saber...
- Tenho feito umas coisas engraçadas ultimamente...
- Pois, já notei.
- Mas sabes, no fundo são só fiozinhos de seda. Limito-me a esticar fios de seda.
- São mais que fios, mais que cordas...
- :)
- "Dona Aranha nada disto faz sentido.".
- Claro que faz, embora nem sempre seja fácil encontrá-lo, percebê-lo, sei lá...
- Mas...
- ...um dia, um dia.

Facto

As delicias do mar comem gomas em forma de ursinhos. E são vermelhas porque preferem as de morango. Já agora, são capturadas no oceano pacífico...

segunda-feira, 9 de junho de 2008

Frio

Tenho frio. E as pessoas não aquecem, não me aquecem. Nem o sol. Nem o mundo nem nada. E olho à volta e pouco vejo, quase não sinto. Não sinto o mesmo, não quero o mesmo. Vejo-me depois perdido sem saber...

Sinto falta dos sorrisos de algodão e dos raios laranja a fugir do olhar. Mas os dias mudaram, o tempo mudou e o mundo também.

sexta-feira, 6 de junho de 2008

manel cruz

"Há quem veja em Jeremias apenas mais uma vítima da sociedade
Muito embora ele tenha a esse respeito uma opinião bem particular
É que enquanto um criminoso tem uma certa tendência natural para ser vitimado
Jeremias nunca encontrou razões para se culpar

Porque nunca foi a ambição, nem a vingança, que o levou a desprezar a lei
E jamais lhe passou pela cabeça tentar alterar a Constituição
Como um poeta ele desarranja o pesadelo para lá dos limites legais
Foragido por amor ao que é belo e por vocação"

Jorge Palma, Jeremias, o fora da lei

quinta-feira, 5 de junho de 2008

Jardim


Há quem não ponha açúcar no café.
E está-se tão bem num outro qualquer lado que não o de dentro. Sei lá eu porquê. Porque sim...
Mais que o sol, tão mais, tão mais, tão mais...