domingo, 30 de setembro de 2007

A estação

A vida e os comboios, ou se calhar os comboios que fazem a vida. Uma enorme estação é o que é. Gente boa e má, de todas as cores e feitios, gordos, magros, altos e baixos. Cada um à espera do seu comboio. Cada um à espera da viagem que o há-de levar dali para algures, seja lá isso onde e o que for.

Olhos ensonados de manhã, corpos suados pela tarde, a tristeza no olhar de alguns e a alegria na voz de outros. Depois há também a apatia de muitos que já não esperam o comboio, mas somente um monte de latas.

Mas um comboio nunca há-de ser para mim um monte de latas. Já perdi alguns por pensar apanhar outros, espero agora pelo próximo que me leve até onde quero ir.

sábado, 29 de setembro de 2007

2 vs 7

Escorre por entre os dedos, esse malvado chamado tempo, mata, moi, tira, dá. Tudo ao mesmo tempo, quase na mesma hora. Gostava de saber onde mora, sei que é o vizinho, mas às vezes é ainda mais dificil encontrar o espaço...

A cidade está cheia de esquinas, encontros e desencontros à beira de duas paredes que se tocam. Parecem diferentes a diferentes horas, em diferentes dias. Gosto de passar por elas e ler as histórias que por lá estão escritas. Cimento, tijolos e tinta, só isso, dirão alguns. Mais, muito mais, acho eu.

Estado de não saber grande coisa, cordas soltas em forma de neurónios que não se atam. Vazio, oco, acho que feliz por já não saber pensar, acho que feliz por saber que há sorrisos, acho que feliz por olhar para o fundo do copo e ver o mesmo som. Ver o som!

O som de um passado não muito distante que é quase igual, quase igual ao que foi. Quase, sempre o quase. Não! Sim, eu sei. Adeus. Até já. Assim, simples demais para poder ser complicado.

Anos, meses e dias, juntos em poucas horas. Eu vi, só eu vi e foi bom de se ouvir.

Nada complicado

São dois braços, são dois braços
servem pra dar um abraço
assim como quarto braços
servem para dar dois abraços

E assim por aí fora
até que quando for a hora
vão ser tantos os abraços
que não vão chegar os braços

Vão ser tantos os abraços
que não vão chegar os braços
prós abraços

Sérgio Godinho, Canção dos abraços

Lógica

As pessoas são más.
Eu sou uma pessoa...

sexta-feira, 28 de setembro de 2007

O nada grande e o tudo minúsculo

- Então é assim.
- Assim como?
- Assim, só, sei lá como. Assim.
- Humm...

Mais uma pedra no charco, mais um charco no chão, menos água no rio, mais rio para o mar, mais mar para o ar, mais água para as nuvens e um dia um pouco mais de água para o charco que de tanta pedra que vai levando há-de transformar-se em poça e de poça em nada.

- Nada?
- Sim nada.
- Não percebo isso do nada.
- É fácil, é só o contrário de tudo.
- Mas nem uma mão vazia está cheia de nada! Há sempre algo, por mais pequeno que seja...
- Algo que por ser tão insignificante é simplesmente nada, mesmo que lá esteja...

Mais um copo, mais uma pedra, uma pedra de gelo num charco acastanhado. Entra algo, um corpo cheio de nada, tem voz mas não fala, tem ouvidos mas não ouve, tem olhos e não vê, tem tudo, mas não sente. O nada a poucos metros de mim. Olho para a mão, a minha mão. Está cheia de um qualquer tudo. Milhões de bichos minúsculos fazem dela a sua casa por umas horas, ou quem sabe alguns dias... Serão felizes?

segunda-feira, 24 de setembro de 2007

Knock, knock!


De nada poderia servir a manteiga nas patas para deslizar na teia. O desiquilibrio era grande demais... Lavei-as, caminho, estico, sinto!

Where will I be?

Não consigo acreditar ainda nas ridiculas histórias que tenho ouvido esta semana. Dão tanto que pensar, pelo menos a mim dão. Desde o louco frustrado que esfaqueia a namorada, passando pelo outro que esfaqueou também o vizinho. Do gajo que quase morre por ter escorregado na altura errada até à personagem que não se aleija quando bate de carro para morrer esmagada quando sai dele. Há depois o ex-libris de alguém que fica sem mão por não ter desligado uma máquina...

É tão fácil não estar cá amanhã!

Baú

Foi preciso esperar dez anos para perceber algumas palavas que então me tinham escrito. Dez anos. Sabe bem lê-las agora passado todo este tempo.

sábado, 22 de setembro de 2007

Bolas de sabão

Passa o tempo devagar, enquanto dou a volta a palavras antigas. Passa o tempo depressa quando procuro palavras novas.

E elas continuam a aparecer, vindas de todo o lado, palavras perfeitas vindas de gente imperfeita. Palavras simples, sei lá o que querem dizer? Sei bem o que quis dizer, sei bem o que não disse nas letras que não cheguei a escrever. E depois há os olhos de quem lê e os olhos de quem escreve, que as palavras não são só letras juntas. As palavras têm alma, têm alma quando são escritas, ganham alma quando são lidas. Palavras há até com alma demais, palavras que passam sorrateiramente o muro do silêncio, não ditas, não escritas, só sentidas.

Silêncio, silêncio, silêncio...

Entrelinhas do que não cabe em poucas letras...

Nunca conheci quem tivesse levado porrada.
Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.
E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil,
Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita,
Indesculpavelmente sujo,
Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho,
Eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo,
Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas,
Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante,
Que tenho sofrido enxovalhos e calado,
Que quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda;
Eu, que tenho sido cômico às criadas de hotel,
Eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de fretes,
Eu, que tenho feito vergonhas financeiras, pedido emprestado sem pagar,
Eu, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachado
Para fora da possibilidade do soco;
Eu, que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas,
Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo.
Toda a gente que eu conheço e que fala comigo
Nunca teve um ato ridículo, nunca sofreu enxovalho,
Nunca foi senão príncipe - todos eles príncipes - na vida...

Quem me dera ouvir de alguém a voz humana
Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia;
Que contasse, não uma violência, mas uma cobardia!
Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam.
Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil?
Ó príncipes, meus irmãos, Arre, estou farto de semideuses!
Onde é que há gente no mundo?
Então sou só eu que é vil e erróneo nesta terra?
Poderão as mulheres não os terem amado,
Podem ter sido traídos - mas ridículos nunca!
E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído,
Como posso eu falar com os meus superiores sem titubear?
Eu, que tenho sido vil, literalmente vil,
Vil no sentido mesquinho e infame da vileza.

Álvaro de Campos, Poema em linha recta

quarta-feira, 19 de setembro de 2007

Tudo certo

Passa a gorda desdentada, desfeita em sorrisos. Passa o gajo de dentes novos que nunca os mostra. Passa o tempo à beira-rio.

Dilemas de quem tem que roubar para viver

"Das coisas mais estúpidas que se fazem lá, é enganar os velhos. Eu era incapaz. Mas até entendo os gajos, se não o fizerem acabam por ir para a rua. Se calhar tinha que fazer o mesmo."

Dito por alguém que trabalha num banco. Há quem convença velhotes a investirem dinheiro durante dez e vinte anos, sabendo que eles podem viver só cinco e que se algum dia o quiserem gastar serão obrigados a fazer um empréstimo que não poderão pagar porque não podem mexer no dinheiro que está no banco.

terça-feira, 18 de setembro de 2007

Ar!

Breathe, breathe in the air
Don't be afraid to care
Leave but don't leave me
Look around choose your own ground
For long you live and high you fly
And smiles you'll give and tears you'll cry
And all you touch and all you see
Is all your life will ever be
Run, rabbit run
Dig that hole, forget the sun,
And when at last the work is done
Don't sit down it's time to dig another one
For long you live and high you fly
But only if you ride the tide
And balanced on the biggest wave
You race toward an early grave

-reprise-

Home, home again
I like to be here when I can
When I come home cold and tired
It's good to warm my bones beside the fire
Far away across the field
The tolling of the iron bell
Calls the faithful to their knees
To hear the softly spoken magic spells


Pink Floyd, Breathe

domingo, 16 de setembro de 2007

Venham, venham caloirinhos!!!

"Quem te não viu anda cego
E quem te não ama não vive"

José Afonso

Só!

De cada vez que tento entender, de cada vez que não percebo, de cada vez em que nada parece fazer sentido, olho para trás, olho para mim, olho para dentro...Quem é que numa passagem de ano foge de toda a gente para se sentar na praia sozinho com uma garrafa na mão a olhar para o horizonte que não é mais que uma sombra negra?

Reis

Perfeitos, todos à minha volta.

Interessante ver que por mais fracassados que sejam, mesmo que a sua vida seja uma espécie de nada, mesmo assim, consideram-se perfeitos. E dão conselhos e fazem julgamentos e ditam sentenças, eles que, como seres perfeitos nunca erraram.

Fizeram sempre as melhores compras possíveis, as melhores escolhas, nunca ninguém foi capaz de os enganar duas vezes, tudo, tudo o que tocam é logo transformado em ouro. Cada decisão, ponderada até ao mais pequeno pormenor para que nada falhe, pois nada falha nunca. Do alto do seu trono, olham para aqueles que nem sempre acertam e logo fazem o filme, logo aparecem os “se” e mais meia dúzia de palavras que de tão usadas já estão gastas.

Olho-os e tento entender de onde terá vindo tanta perfeição, de onde terá caído tal sorte que leva muitos deles a esconder o passado e outros a viver num presente imaginário. Vivem num alto castelo, esquecem-se que os alicerces foram feitos num poço de areia. É tão fácil fazê-los cair, tão fácil…

...

O Carapau

Acho que a melhor refeição da minha vida foi um carapau, um carapau ranhoso e mal assado. Um carapau ranhoso e mal assado num dia em que não havia dinheiro para mais que isso e em que a vontade de comer era mais que muita. Comi-o como se fosse o melhor prato do mundo. Ainda hoje me lembro daquele peixe quando ouço gente a queixar-se da comida que tem no prato por tudo e por nada.

Cinco anos, alguns meses e duas semanas

Amanhã é segunda-feira, será mais uma. Sei lá quantas já passaram desde aquele dia. Cinquenta e duas num ano, cinco anos e alguns meses. Parece que foi ontem. O pequeno-almoço à espera, o almoço que demorava horas a fazer, o café onde não mais voltei… E de repente toca o telefone, virar para a esquerda ou seguir em frente? Foi para a esquerda o caminho.

Tinha sido um dia bom, e eu que nem estava para ir, lembrei-me e fui. E no fundo, do que sinto mais falta é do banco que estava ao fundo das escadas, das horas perdidas naquele banco… Hoje bateram à porta da frente, coisa rara cá em casa, passei pelas flores, as ultimas que pude oferecer. Paro sempre para pensar quando passo por elas. Ironia, tanta ironia… São girassóis, secos (foi a única vez que comprei flores secas).

Cinco anos, alguns meses e duas semanas. No vai e vem da vida, tiveste a merda do ramo contigo duas semanas. Agora tens flores frescas todas as semanas de quem não as deu enquanto as podias ver. Estranho escrever para quem não lê, não importa, afinal todos os dias falo para quem não ouve…

quinta-feira, 13 de setembro de 2007

Lugares

Tanto lugar, tanto, tanto...

Desde pedras a praias, passando por casas e ruas, escadas e portas, pontes e praças... Lugares que há para conhecer, assim sejam mostrados, metros e mais metros de emoções espalhadas por lá, por ai, sem que o comum dos mortais se aperceba de tal.

Cantos. são só cantos e são só de quem os vê com olhos de sentir. Os pequenos sitios de quem os tomou e vive como mais ninguém o faz. Gosto de conhecer lugares assim, gosto de mostrar lugares assim, gosto de os sentir.

Gosto de estar onde me sinto bem, seja lá isso onde for, pode até ser na palma de uma mão estendida.

Maresia

Se me fechassem numa caixa para o resto da vida e me dessem à escolha algo de cada um dos seis sentidos, seria este o cheiro que levava.

Se alguém o conseguir descrever agradeço.

Inspiro...

Sarcasmo

Com tanta especulação que por ai anda já alguém ponderou a hipótese de a Maddie ter sido comida num qualquer hamburger?

terça-feira, 11 de setembro de 2007

6!

Eu estive no aeroporto de Lisboa no dia 12 de Setembro de 2001. Não foi dificil perceber que algo tinha mudado no mundo...

segunda-feira, 10 de setembro de 2007

Pro ano há mais...

Faltam-me as palavras para dizer o que foi a Festa, o que é a Festa... Todo o trabalho, todo o voluntariado, toda a paz que há por ali.

Não é um festival, a Festa. Ali há novos e velhos e criancas e gente que nem sabe muito bem o que é. E uma música especial que põe milhares de pessoas aos saltos! Mais os concertos às duas da tarde e o fecho de tudo quando a noite ainda mal nasceu, o continuar com quase nada e ai a Festa já é completamente nossa.

É estranho o acordar!

1º de Maio

Se há magia neste mundo, um bom bocado mora perto de um lago em três dias de Setembro. Quem já entrou naquele auditório de terra batida sabe do que estou a falar, a quem nunca o fez digo-lhes que vão. Vale a pena.

Não é todos os dias que vemos artistas que já correram mundo com lágrimas nos olhos.

Surreal...

...é ir a passar na rua, perguntarem por ti e nisto começar a tocar "Portugal, Portugal" nas colunas à volta enquanto me cruzo com um gajo vestido com uma t-shirt sorridente.

sábado, 8 de setembro de 2007

As panelas

Cá, mais uma vez, algures na festa que é de todos. Sorrisos há em todo o lado, musica não falta e o resto por cá anda. Cedo para fazer um balanço de verdade, mas já se pode ver que não há sitio melhor para fazer uma revolução. E se eu precisava de uma.

Longe do mundo, longe do tempo, assim, só. Olho para o bolso de vez em quando e sorrio porque é a única coisa que posso fazer. É incrível o que uma mente desocupada pode. Dramas e histórias complicadas que vão surgindo à medida que as horas passam...

No fundo a verdade é que um pouco de linha resolve tudo. Uma linha fina que ao passar várias vezes no mesmo buraco, cose e acaba por o fechar. A linha na forma de uma lata de tinta às 9 da manhã de um dia de sol.

Panelas. Andei a lavar panelas no Avante!

Soltas

Aldina Duarte;
Finos a meio euro;
Carvalhesa;
Lago;
Três grades;
Montes de gente que não julgava andar por cá;
Dois dias...
:)

quinta-feira, 6 de setembro de 2007

Avante!

Hora de partir. Levo um sorriso, levo algo mais. Afinal é tudo fácil, assim.

Entre o ré e o fá

Eu percebi, tu percebeste. Obrigado pelo gesto. Gosto de coisas pequenas, é isso que torna as pessoas grandes. Não há lugar para mágoa no meu peito. Agora vou. Levo-te no bolso.

quarta-feira, 5 de setembro de 2007

Vem!

terça-feira, 4 de setembro de 2007

Carta

Saudade, essa palavra tão nossa. No plural dá saudades, saudades… Tantas. Tentei perceber o que era impossível até que desisti sabes? Também sabes que nunca fui pessimista e que gosto de gozar com eles, muito, aliás, gostamos.

Foi por isso que no Domingo me voltei a deitar com um sorriso nos lábios, um sorriso de quem pensa que viveu numa espécie de pesadelo acabado de terminar. A falta. A falta de tudo, de um simples olhar, de um sorriso, de um riso, da maneira como gritavas "Bétô", mais que isso tudo a falta das palavras, das tuas palavras, das nossas palavras, do código. Lembras-te do código? Nesse dia ao voltar a falar contigo fiquei um eu mais feliz, feliz por gostares do anormal, feliz por ver aquela foto que sei bem quando e onde foi tirada. Feliz por lembrar aquela noite, aquela manhã… Assim, só. Feliz. E cheio de esperança.

Segunda era outro dia, primeiro dia, primeiro exame, sem qualquer tipo de esperança de te ver. Não imaginas como fiquei quando sem estar à espera te vi ali, no lugar onde já devia ter procurado, encontrei de novo o teu sorriso, houve quem dissesse que tinha encontrado também o meu. Nesse dia de manhã passava na rádio uma música do Sérgio, sim, acordei a ouvir “o primeiro dia”. Primeiro dia de um novo ano, um novo começo pensei… Chegado à noite faço o balanço, fiz também o jantar ontem, exame para 20 e um belo sorriso, bom dia, pensei.

Sabes como acordei hoje? Acordei com uma “canção simples”, lembrei-me de ti, meia hora depois passou novamente no autocarro. Não mandei a mensagem que escrevi, não por pensar duas vezes mas porque me perdi no tempo e esqueci de carregar na tecla (acontece-me muitas vezes). Vou para o sitio do costume e tento estudar, não consigo, dou voltas a pensar no que hei-de escrever na folha em branco estendida à minha frente (tenho escrito muito nestes dias…) até que recebo aquela mensagem. Fico branco, ofereço o abraço que recusas e lembro-me de ir à tua procura. Ando os 200 metros até à loja, vejo a Raquel ao longe e volto costas, afinal tinhas dito que não querias… Dou voltas a mim, voltas à cabeça, voltas aos papeis que tenho na mesa tal qual o velho carrancudo que se costumava sentar perto de nós. Estendo a mão, eu estendo sempre a mão, não a queres agarrar, pergunta-me o mano como é amanhã, não lhe conto de ti. Almoço no bar que não é nosso porque dei parte de fraco sem ainda te ter explicado porquê, o dono é um pouco estranho mas está lá uma senhora simpática. Almoço, fino, fino, fino, exame. Correu mal, sim. Acabo e estendo a mão outra vez, ando duas horas às voltas à cidade, não sem antes ter pintado a minha de negro. Negro como eu. É assim que me sinto desde o dia em fiquei sem poder pensar, o dia em que a vida mudou. Bela semana que tive, que tivemos, acho. Adorei aquele dia, aqueles dias, a viagem por caminhos perdidos, a chegada, a noite, o teu acordar… Adorei ver-te chegar perdida dias depois à Figueira, adorei ver a tua cara quando apareci com as flores. “És doido” disseste, ”És louco” disseram os outros, três horas de viagem e cinco quilómetros a pé só porque me apeteceu, por ti, porque sabia que ia ver aquele sorriso e o raio laranja nos teus olhos, porque sabias que era capaz de partir e ir onde fosse preciso, mas ainda não sabia que o faço também por ti, sabes agora porque o fiz. Não podes imaginar o que aconteceu à minha alma naquele dia em que não apareceste, em que não deste noticias, em que não me falaste. O egoistazinho de merda que só queria ouvir um “tou bem”. Depois veio a doença, as batas brancas, o medo. Apareceu quase ao mesmo tempo a menina de quem ainda não te falei, perdida em liliput, sem conhecer ninguém, acontece que por estes lados as pessoas vêm tudo a dobrar e o que eram estúpidas conversas tornaram-se horas de namoro… Imagina lá o que foi o dia em que a deixei em casa. Mais um dia, mais um pouco de escuro, uma despedida, mais uma, se calhar sem regresso e por isso não fui a Mirandela, nem estive na despedida, nem fiz merda nenhuma porque estava entre uma chegada e uma ida para o hospital que detesto. Negro, negro demais.

E finalmente, depois de meses a imaginar-nos aos saltos a ouvir Aquela música eis que tudo deixa de fazer sentido. Não percebo nada de nada sabes? Porque é que está tudo a acontecer assim, nada parece fazer sentido. Quero sentar-me contigo a ver as estrelas e a falar, quero tanto falar, quero tanto dizer o que não cabe aqui. Quero tanto que fales, que me contes a história que há tanto prometes, que chores… Nunca te vi chorar. Vai, vai comigo, vamos ser felizes por dois dias, esquecer o negro e a morte e a doença e tudo naquele lugar lá longe do tempo. Vem!

segunda-feira, 3 de setembro de 2007

...

Não consigo dormir
Deve ser do café que eu insisto em tomar
Depois do jantar
Ou então do jantar
Que é preciso engolir quando o corpo diz não
Sem qualquer razão
Ou então dos problemas que eu teimo em complicar
Há sempre gente em pior condição
O miúdo das cautelas não reparou ao atravessar
Um automóvel atirou-o ao chão
Estou deitado na cama
E apetece-me acelerar

Não consigo pensar
Deve ser do cansaço de me ocupar demais
De coisas banais
Ou então é do vinho
Não se deve beber fora das refeições
Salvo raras excepções
Ou então do bloqueio em volta do pensamento
As ideias passam ao largo sem atracar
A rapariga do xaile era um verdadeiro monumento
Com monumentos não se pode falar
Estou aqui no sofá
E apetece-me evaporar

Conta-me uma história
Só mais uma história
Só mais uma história

Não consigo parar
É talvez a lembrança da criança que eu fui
Que ainda me dói
Ou então a amargura
De saber que não sou o herói que sonhei
E que abandonei
É talvez a loucura a envenenar-me a memória
Gritando em surdina: recordar é viver
Aquele velho no jardim também teve os seus sonhos de glória
Vou ser parecido com ele quando envelhecer
Ando às voltas de mim
E apetece-me adormecer

Conta-me uma história
Só mais uma história
Só mais uma história

Jorge Palma, Só mais uma história

domingo, 2 de setembro de 2007

Anormal

Primeiro surge o elogio, "Parece um menino", agradeço com o olhar e encosto-me na cadeira. Vão passando as horas devagar até que chega a noite. Uma vela roubada, logo acesa no centro da mesa, gente á volta, copos à frente, noticias do outro lado do mundo e uma página escrita num qualquer livro onde só se lia "Felicidades". Falei em oito tábuas, no amanhã que não existe e acabei o texto com um gigantesco "FODA-SE".

sábado, 1 de setembro de 2007

Noite

Até na noite mais escura há uma estrela a brilhar. Pode estar escondida, mas existe, basta procurar.