sexta-feira, 3 de julho de 2009

#32

no fundo do poço cai o corpo na lama mole. desfaz-se a carne, perde-se a alma, sobram os ossos. o poço não tem fundo. o poço tem lama no fundo. as fendas nos ossos contam as histórias que nunca chegaram a ser palavras. histórias de um tempo em que se marcava o corpo ao ritmo das quedas no chão por entre choros e gargalhadas.

no fundo do poço, na pouca água que ainda resta na poça pequena boiam sorrisos e olhares mais uns quantos pedaços de mãos partidas pelo tempo. o mesmo tempo que cavou o poço até este não ter fundo onde repouse a água. onde descansem os ossos. onde morra o corpo cansado da vida vivida a correr por entre os espaços que as horas abriram no velho relógio cheio de pó. faltou-lhe a corda, parou o tempo. deve ter sido por isso que os dias se tornaram todos iguais e os gestos se passaram a esconder no mesmo baú onde se foram fechando também as palavras e as entrelinhas a sete chaves, logo torcidas até partir.

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