quinta-feira, 12 de setembro de 2013

a falta que nos faz um Almada



pim!

será um pássaro?

há 12 anos havia um desgraçado qualquer a cagar às 9 da manhã. o desgraçado levou com um avião em cima. ah! a ironia.

terça-feira, 10 de setembro de 2013

maio

se houvesse uma prateleira para guardar concertos este havia de estar lá. e depois pensar que dez, vinte, trinta maios depois ainda faz sentido haver um dia primeiro. porque ainda há sangue, manadas, vampiros e carraças. e há palcos à beira lago-rio-mar-qualquer-coisa. e há dias assim.


segunda-feira, 10 de junho de 2013

éter



ó minha benévola terra
se eu te pudesse beber,
pacificar, fazer guerra,
sentar-te à mesa e escrever.

ó minha terra de arados
de tardes lentas e quentes,
e luz que mostra parados
rebanhos incandescentes.

quando passo de automóvel
esqueço-me de onde moro
porque sou meu lar imóvel.

o rádio sempre a tocar
um coração avariado
que não posso desligar.

Rui Lage

domingo, 10 de junho de 2012

das anologias com mangas e máquinas de secar ou o dia que não o é do país que ainda o quer voltar a ser

Como vais tu morrer
em portugal
que te assenta de igual modo à camisola
que lavaste no programa errado;
Como vais vender os teus versos
ao preço da chuva
num país de cheias
e lágrimas fáceis;
Como vão as tuas palavras
arder no coração daqueles
que vêem as florestas
sucumbir ao fogo
todos os verões;
Como vais ficar em nada
como o gelo no whisky
no copo da mulher
que o teu marido ama;
Como vais, tu, abrir os braços
se só já tens penas
como o pobre Garção?

Ana Paula Inácio

terça-feira, 2 de agosto de 2011

Fe

flor. uma cortina verde-castanha-riscas à frente do palco arredondado, antes branca. é o mundo grande-pequeno visto do pássaro de ferro com asas de ferro também.

onomatopeias agora. clac clac, vrrrrr vrrrrr, pfffff pfffff. vira um pouco e torce-se a vista. tanta volta para chegar ao mesmo sitio.

começo.

a flor-conjunto-de-átomos e os povos das (re)encarnações ou (re)florações se é que as acreditam é que devem ter razão. eis. é o ferro desta vez. ferro espada, ferro sangue, ferro cheiro, ferro cor. boi, a chave.

do alto, a cortina branca foge, abre e deixa perceber a outra, a tal verde-castanha ora riscas ora quadrados ora o bonito não padrão. há mais debaixo. terra. o mundo por baixo do mundo e lá, lá fundo, a emergir, o ferro. o mesmo do sangue nosso e das ervilhas, o mesmo da ponte feita por medida, o de que é feita a cor que o pinta, o dos barcos, o de quase tudo.

flor. é de ferro o xilofone que toca melodias flor e horas no por entre o pó de um dia de sol.

segunda-feira, 18 de julho de 2011

Phaseolus vulgaris

Imagina-te de novo de volta à escola. O quadro preto em frente, a cruz por cima, um cristo magro e pintalgado de verde a olhar para o vazio.

Dois mais dois são quatro sem nunca se explicar ou perceber bem porquê. Números são números e estes não enganam. Tudo isto na altura em que havia um senhor de fato preto às riscas a convencer-nos que o também o algodão podia ser um número. "Não engana" dizia. Falava do algodão.

Um frasco. Protocolo (palavra nova só mais tarde aprendida já em quadro branco, não melhor que o preto). Material: àgua, armário, frasco, algodão, feijão e sol.

Depois era o feijão no frasco e o ridiculo de tudo aquilo num lugar onde depois das quatro nos rebolávamos pela terra.

Era na terra que a realidade fazia mais sentido. Um dia despontava um pouco de verde, no outro uma outra folha, regar, mais uns centimetros dia após dia. Esperar. Devagar até ao grão final.

Lição primeira: é preciso tempo;
Lição segunda: a história do João pode ser verdade numa tarde de sol;
Lição terceira: por mais que repetidos sejam os gestos nunca o resultado é o mesmo.

Três lições num feijão. Hoje em dia já não devem aprender estas coisas na escola. Muito menos terão terra para a cheirar molhada.

Fim.

Irrita-me a urgência dos tempos mais modernos que os do senhor Charlie. Vi, sem ver, alguém chorar por não ver um filme no dia da estreia.

sexta-feira, 29 de abril de 2011

dos impérios que não caem




sonhei esta noite com o FMI. fazia sol. estava ali na praça do imperio e eram cinco. iamos reunir nos jerónimos. escorriam restos de marisco pelo canto da boca. alimentam-se bem, pensei. acordei depois. nem tempo tive de lhes dizer de quem é a culpa de tudo isto. dos espelhos. os espelhos pendurados pelos cantos que fazem as pessoas sorrir mais para elas do que para os outros. eles que venham. os impérios não caem. talvez seja por isso que se pede pão de maneira igual em mértola e tokyo. e somos maiores. maiores que eles mesmo que debaixo do braço tragam pastas ruças pelo tempo e cheias de notas. é bonita a nossa terra. e tem também jacarandás. e barcos. e mar. e um império em forma de praça. e o outro.

domingo, 5 de dezembro de 2010

a distância lá no muito alto mede-se em pés

Quatro e meia da tarde. A cidade grande aos pés. Homens formiga e carrinhos de brinquedo. Da varanda vejo o longe pintado nas latas dos aviões que vão passando, como uma maçã de Carrazeda de Ansiães, vejo o Tejo já sem falar espanhol, consigo ver a outra banda até em dias como não hoje, de cinza e água caída em gotas.

Sopro o café vindo sei lá de onde. O cheiro quente do grão abafa o de alguma gota de suor caída meses antes. Quero que seja do Brasil, dá-me jeito, até porque é fácil de imaginar com a cabeça do Rei um pouco à vista. É novo. Soube que fez cinquenta anos há pouco tempo.

Arrefece, não gosto de café quente. Tic-tac e volto à cadeira. A partir de agora é China. Os chinesinhos alinhados de cara igual para um dia igual ao outro igual ao outro igual de cara igual a colar pedaços de ouro com colas estranhas. Os computadores são feitos de ouro sabias? Também de silício mas isso seria outra conversa que iria terminar num vale. Pena não ser o vale do Ave. Pena que por lá já não se transformem partes de ovelha em almoços e camisolas. Talvez em almoços ainda. Por enquanto. Tenho os pés aquecidos por três putos tailandeses cheios de fome e tosse convulsa. 

Tal como a cerveja, o café é um diurético. Carrego no botão e imagino a tainha de boca aberta para a fotografia. Mais uma semana e a capital do país onde vivo deixará de ter os esgotos ligados directamente ao rio. Coisas que o progresso faz. Não sei se alguém pensou na desgraça dos peixes, falta-nos o pregador Vieira.

Suspiro. É tarde. Na rua o queixume de sempre. Ou faz sol ou frio, acaso chove, nevar, isso, já é raro. Uma desgraça, no fundo. Dizia o poeta que “não importa sol ou sombra” mas a verdade é que tudo importa demais. De duas ribeiras nasceram as duas principais avenidas da cidade, sabias? A da Liberdade, liberdade, fica melhor assim com letra pequena e a Almirante Reis, o homem que com medo de morrer se matou sem que fosse preciso, a vergonha é uma coisa fodida. Eram ribeiras as avenidas. Teorizo que talvez as pessoas se assemelhem a água, eventualmente tem que ver com os setenta e tal por cento, basta um olhar pouco atento para ver onde se vão estendendo os corpos que pouco já vão devendo à outra parte do mundo, e a esta também, afinal. Lá estão eles nas ribeiras antigas, nas margens, a confluir lentamente para baixo, cada vez mais para baixo, fundo. Diz-se que no dia em que um dos elefantes fugir do zoológico poderá passear por baixo da rua Augusta sem grandes apertos. Dos corpos na margem digo que não gostam de maçãs. Até os esfomeados têm direito a ser esquisitos, percebo-os, mas deixei de dar chocolates.
Hei-de aprender a dizer alguma coisa em Indiano.

Nem tudo é mau, desenganem-se os que nos querem dar como perdidos. Temos agora também blindados. Dão um jeito enorme para as cimeiras. Podem dar jeito para quando numa eventualidade desmentida por todos os quase mil anos de história o povo pegar em tudo o que tiver à mão e marchar rumo a qualquer lado (guardo num postal a preto e branco memórias bonitas de outros tempos no largo do Carmo) para espetar uma facada nos organizadores desta excursão reles prometida para o céu mas onde pelo caminho apenas se vêm placas a indicar o abismo. 

Já comprei o pão para a noite. Dezasseis cêntimos. Trinta e dois escudos, um pão. Ainda puto, levava cinquenta escudos para uma manhã de escola, cem para o dia todo. Pão, sumo, batatas fritas e rebuçados. Já fui rico.

Ainda não sei dizer uma palavra em Indiano, apesar de ter mais indianos que Portugueses como vizinhos.
Perdi a fome com tudo isto. Antes de ir sonhar com a paz nuns braços pequenos de sorriso aberto vou à janela olhar para a lua escondida pelas nuvens. E lá, na lua que não vejo, milhões de olhos reflectem luz e sonhos também. Talvez maiores que os meus, que os nossos todos juntos. 

Sete andares abaixo, os homens parecem menos formigas e mais humanos. Coisas piores, portanto. Quase todos. Quase…