sábado, 24 de junho de 2006

Só cansado...

O que há em mim é sobretudo cansaço
— Não disto nem daquilo,
Nem sequer de tudo ou de nada:
Cansaço assim mesmo, ele mesmo,
Cansaço.

A sutileza das sensações inúteis,
As paixões violentas por coisa nenhuma,
Os amores intensos por o suposto em alguém,
Essas coisas todas —
Essas e o que falta nelas eternamente —;
Tudo isso faz um cansaço,
Este cansaço,
Cansaço.

Há sem dúvida quem ame o infinito,
Há sem dúvida quem deseje o impossível,
Há sem dúvida quem não queira nada —
Três tipos de idealistas, e eu nenhum deles:
Porque eu amo infinitamente o finito,
Porque eu desejo impossivelmente o possível,
Porque quero tudo, ou um pouco mais, se puder ser,
Ou até se não puder ser…

E o resultado?
Para eles a vida vivida ou sonhada,
Para eles o sonho sonhado ou vivido,
Para eles a média entre tudo e nada, isto é, isto…
Para mim só um grande, um profundo,
E, ah com que felicidade infecundo, cansaço,
Um supremíssimo cansaço,
Íssimno, íssimo, íssimo,
Cansaço…

Álvaro de Campos

7 comentários:

Marta Campos disse...

acho que ele já disse tudo... "íssimo, íssimo, íssimo/ cansaço." onde viverá o possível??!!!

leonor costa disse...

Profundo este poema que traduz bem o cansaço que muitas vezes nos invade. No entanto, como é próprio do ser humano, as forças renovam-se e continuamos, de luta em luta, de cansaço em cansaço, à procura do nosso "arco-iris" onde exista o verde da esperança, o azul do sonho e, sobretudo, o rosa do amor. Tudo virá a seu tempo e, para quem é jovem como tu, muitas coisas boas te esperam. Luta por elas!

Um grande beijinho

leonor costa disse...

Sonha, sonha sempre! Torna a vida mais fácil.

Beijinhos

leonor costa disse...

Oi... ainda não descansaste? Vem até cá pois tenho uma coisa para te contar!

Beijinhos

isa xana disse...

Álvaro de Campos não é o heterónimo de Pessoa que mais aprecio, mas não posso não reparar na beleza da sua escrita

*

Danni disse...

Profundo... obriga a introspecção... Um grande beijinho, Yuri.

Margarida disse...

Ai, como eu adoro este poema! Não podia dizer mais sobre mim...
No fundo, acho que ele diz sempre um bocadinho de alguém. Os sonhos, a vida, o cansaço...

Beijo*

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