quinta-feira, 3 de setembro de 2009
esfera
segunda-feira, 31 de agosto de 2009
sábado, 29 de agosto de 2009
da diferença que faz uma letra a seguir ao nome de uma doença vulgar
quinta-feira, 27 de agosto de 2009
O medo vai ter tudo
pernas
ambulâncias
e o luxo blindado
de alguns automóveis
Vai ter olhos onde ninguém o veja
mãozinhas cautelosas
enredos quase inocentes
ouvidos não só nas paredes
mas também no chão
no teto
no murmúrio dos esgotos
e talvez até (cautela!)
ouvidos nos teus ouvidos
O medo vai ter tudo
fantasmas na ópera
sessões contínuas de espiritismo
milagres
cortejos
frases corajosas
meninas exemplares
seguras casas de penhor
maliciosas casas de passe
conferências várias
congressos muitos
óptimos empregos
poemas originais
e poemas como este
projectos altamente porcos
heróis
(o medo vai ter heróis!)
costureiras reais e irreais
operários
(assim assim)
escriturários
(muitos)
intelectuais
(o que se sabe)
a tua voz talvez
talvez a minha
com a certeza a deles
Vai ter capitais
países
suspeitas como toda a gente
muitíssimos amigos
beijos
namorados esverdeados
amantes silenciosos
ardentes
e angustiados
Ah o medo vai ter tudo
tudo
(Penso no que o medo vai ter
e tenho medo
que é justamente
o que o medo quer)
O medo vai ter tudo
quase tudo
e cada um por seu caminho
havemos todos de chegar
quase todos
a ratos
Sim
a ratos
Alexandre O'Neill, Poema Pouco Original do Medo
domingo, 23 de agosto de 2009
da lanterna azul
quinta-feira, 20 de agosto de 2009
(alindar)
(os lábios molhados a sal. brno-bratislava. era tudo quase simples e tu a chegar. era tudo quase simples e borboletas na barriga. era tudo quase simples e tu a chegar. tu a chegar...)
sexta-feira, 7 de agosto de 2009
#
quarta-feira, 29 de julho de 2009
#
De matar galinhas
Porém são capazes
De comer galinhas
O dinheiro cheira a pobre e cheira
À roupa do seu corpo
Aquela roupa
Que depois da chuva secou sobre o corpo
Porque não tinham outra
O dinheiro cheira a pobre e cheira
A roupa
Que depois do suor não foi lavada
Porque não tinham outra
"Ganharás o pão com o suor do teu rosto"
Assim nos foi imposto
E não:
"Com o suor dos outros ganharás o pão".
Ó vendilhões do templo
Ó construtores
Das grandes estátuas balofas e pesadas
Ó cheios de devoção e de proveito
Perdoai-lhes Senhor
Porque eles sabem o que fazem.
#
Mas ainda tenho coração...
Boa noite e merda!...
(Estala, meu coração!)
(Merda para a humanidade inteira!)
Na casa da mãe do filho que foi atropelado,
Tudo ri, tudo brinca.
E há um grande ruído de buzinas sem conta a lembrar
Receberam a compensação:
Bebé igual a X,
Gozam o X neste momento,
Comem e bebem o bebé morto,
Bravo! São gente!
Bravo! São a humanidade!
Bravo: são todos os pais e todas as mães
Que têm filhos atropeláveis!
Como tudo esquece quando há dinheiro.
Bebé igual a X.
Com isso se forrou a papel uma casa.
Com isso se pagou a última prestação da mobília.
Coitadito do Bebé.
Mas, se não tivesse sido morto por atropelamento, que seria das contas?
Sim, era amado.
Sim, era querido
Mas morreu.
Paciência, morreu!
Que pena, morreu!
Mas deixou o com que pagar contas
E isso é qualquer coisa.
(É claro que foi uma desgraça)
Mas agora pagam-se as contas.
(É claro que aquele pobre corpinho
Ficou triturado)
Mas agora, ao menos, não se deve na mercearia.
(É pena sim, mas há sempre um alívio.)
O bebé morreu, mas o que existe são dez contos.
Isso, dez contos.
Pode fazer-se muito (pobre bebé) com dez contos.
Pagar muitas dívidas (bebezinho querido)
Com dez contos.
Pôr muita coisa em ordem
(Lindo bebé que morreste) com dez contos.
Bem se sabe é triste
(Dez contos)
Uma criancinha nossa atropelada
(Dez contos)
Mas a visão da casa remodelada
(Dez contos)
De um lar reconstituído
(Dez contos)
Faz esquecer muitas coisas
(como o choramos!)
Dez contos!
Parece que foi por Deus que os recebeu
(Esses dez contos).
Pobre bebé trucidado!
Dez contos.
sábado, 25 de julho de 2009
2
segunda-feira, 20 de julho de 2009
#
sexta-feira, 17 de julho de 2009
do(s) Mundo(s)
no fundo são só pedaços de frango e diferentes maneiras de olhar para eles.
há quem morra sem tal saber"
sexta-feira, 10 de julho de 2009
do ar
Mas as medidas são só mais uma coisa que o homem inventou por ser incapaz de ver o mundo como na verdade é. A mania crónica de pôr tudo e mais alguma coisa em caixas quadradas demais, mesmo que a olho nú a maioria dos objectos nem tenham forma. Medidas, caixas, etiquetas, rótulos...
Como se três horas e meia alguma vez pudessem ser diferentes de três horas e meia, como se dois cêntimos fossem mais que duas reles peças de metal, como se os relógios pudessem parar as horas todas durante a noite e fazer a manhã tardar por dois dias, como se tudo isto fosse possível. Como se o mundo todo estivesse à distância de um sono mal dormido embalado por um roncar de motor...
Como se. Como se tudo fosse verdade para alguns sendo mentira para outros, como se fosse possível haver maneiras diferentes de olhar a lua em dias que se mostra cheia, como se fosse possível haver mais que um deus aos olhos de quem o acredita, ou até, como se algum dia pudesse o chão abrir-se em dois ao som de um qualquer leão imaginário a rugir.
Prefiro o caos das formas às caixas quadradas, que me desculpe a "Humanidade".
quinta-feira, 9 de julho de 2009
quarta-feira, 8 de julho de 2009
segunda-feira, 6 de julho de 2009
#33
Porque o que basta acaba onde basta, e onde acaba não basta,
E nada que se pareça com isto devia ser o sentido da vida..."
sexta-feira, 3 de julho de 2009
#32
no fundo do poço, na pouca água que ainda resta na poça pequena boiam sorrisos e olhares mais uns quantos pedaços de mãos partidas pelo tempo. o mesmo tempo que cavou o poço até este não ter fundo onde repouse a água. onde descansem os ossos. onde morra o corpo cansado da vida vivida a correr por entre os espaços que as horas abriram no velho relógio cheio de pó. faltou-lhe a corda, parou o tempo. deve ter sido por isso que os dias se tornaram todos iguais e os gestos se passaram a esconder no mesmo baú onde se foram fechando também as palavras e as entrelinhas a sete chaves, logo torcidas até partir.
Definições
sexta-feira, 26 de junho de 2009
terça-feira, 23 de junho de 2009
Quase
segunda-feira, 22 de junho de 2009
Tamanduá
José Luís Peixoto, Cemitério de Pianos
domingo, 21 de junho de 2009
Tijolo sete
Tic-tac...
da palavra
A ausência, estão sempre a ensinar-nos, é quase melhor do que a presença. A saudade embeleza os sentimentos. A memória melhora. As lágrimas lavam a vista. A saudade dói, mas é doce. É o que nos dizem."
Miguel Esteves Cardoso, A Aventura das Saudades
terça-feira, 16 de junho de 2009
do ponteiro dos segundos
E a Maggie, onde pára? E todos os outros que foram passando?
Agora até já se atravessa o rio por uma ponte nova. Apareceram livros, canções, filmes... Como é que é possível que se tenha vivido num tempo sem “Fon-fon-fon”? Criaram-se peças de teatro fantásticas e outras menos boas. Abriram bares, fecharam bares, bares mudaram de nome, mudaram de sitio. Acabou o D.D. e o karaoke da quarta também já não é na mesma rua. Também já não há a Chica para cantar e chorar depois aninhada no meio de um corredor.
Descobriram-se varandas, túneis, caves e peles de javali penduradas no tecto.
Dezenas de ovos a voar, um fósforo queimado, centenas de nomes, milhares de gritos. Quantos quilos de carne e batatas? Oito dias passaram a dez.
Rosas, girassois e flores de imitação. Comboios, aviões, autocarros, carros, pés, quilómetros, metros. Chãos de pó, chuva miuda, sol abrasador, brisas leves, areia, jardins. Caixas, ferramentas, o primeiro sábado do primeiro fim-de-semana de Setembro por volta das três da tarde.
Palavras a fazer doer mais que ferros em brasa cravados no peito.
Morte, morte, morte.
Casamentos, divórcios, zangas, partidas, ilhas.
Bengalas e identidades queimadas, fogo, chamas, quente. Andarilhos, sapatilhas amarelas, amanhecer, escadas, ruelas, pés descalços, corridas, “foda-se!”.
Caixas de correio, quartos, barris e copos. Personagens que vão e vêm e passam e entram e saem e desaparecem e reaparecem e desaparecem de vez e tudo isto ao ritmo marcado pelo tic-tac do velho relógio. Latas, garrafas, papel, preto, preto, preto, “vai!”.
Os mapas agora alinhados à direita da estante, o algodão a repousar ao lado e uma aranha a brincar no fio de teia que pende do tecto.
segunda-feira, 15 de junho de 2009
Não cá
Restam os espelhos e os olhos para que o engano persista, para que tudo seja, aparentemente, normal.
Dói-me a cabeça embora não doia.
sexta-feira, 12 de junho de 2009
(Um)a ironia
quarta-feira, 10 de junho de 2009
Junho, 10
No dia em que a Califórnia deseje ser o Portugal da América.
Será aí cumprido o destino.
Que levante
Define com perfil e ser
Este fulgor baço da terra
Que é Portugal a entristecer —
Brilho sem luz e sem arder
Como o que o fogo-fátuo encerra.
Ninguém sabe que coisa quer.
Ninguém conhece que alma tem,
Nem o que é mal nem o que é bem.
(Que ânsia distante perto chora?)
Tudo é incerto e derradeiro.
Tudo é disperso, nada é inteiro.
Ó Portugal, hoje és nevoeiro...
É a hora!
Valete, Fratres.
terça-feira, 9 de junho de 2009
Junho, 9
O medo de abrir a porta e não haver mais chão para pisar como acontece naqueles sotãos, que por vezes se encontram por ai no meio de ruas semi desertas, sem escadas, só com um buraco tapado por uma porta de madeira.
Duas agulhas pequenas.
O papel de parede já gasto a chamar as unhas roidas, a noite na rua e o candeeiro de luz amarelada. Sempre a luz amarela a iluminar os sonhos. Amarelo até que nem é uma palavra feia. Outras há mais bonitas, alalia, por exemplo. Andarilho, terrina, lápis... Divagações parvas e o medo escondido debaixo do tapete.
Números na ponta dos dedos, à frente dos olhos, medidas e contas agora cada vez mais difíceis de fazer que isto das contas nunca foi simples que há sempre sempre alguém para lembrar que a distância entre dois pontos é sempre infinito. Sempre!
Lá em baixo há corpos que se arrastam rumo ao nada um pouco mais abaixo, ao fim da rua que é a descer. Lá em baixo não há sótãos e os monstros vivem na terceira casa do lado direito, toda a gente sabe.
É mais um segundo, minuto, hora, dia, mês.
Mas há frases que existem escritas por dentro da pele.
E o sol nasce às quatro e meia da manhã.
domingo, 7 de junho de 2009
quinta-feira, 4 de junho de 2009
terça-feira, 2 de junho de 2009
Números
"Todos os dias, há mais 6.800 pessoas infectadas pelo vírus da sida e morrem 5.700 doentes, de acordo com o relatório da ONU sobre a doença no mundo em 2007"
"Mais de três mil crianças morrem de malária por dia na África"
"Mais de dois milhões de pessoas morrem de fome a cada dia"
e ao cairem até que sentimos coisas estranhas e até que aparece logo alguém a falar nas mensagens de ultima hora, logo num lugar onde há tudo menos rede. Whisky, café e chá, vinho tinto talvez haja... Rede, podia haver até uma rede antes de chegar ao mar. E se houvesse tinham morrido menos duzentos e qualquer coisa. Duzentos e qualquer coisa mais um ou dois, os importantes, os que se conhecem que os outros serão sempre só numeros... Como os 5700 + 3000 + 2000000.
Afinal de contas não há-de ficar ninguém por cá. Mas quantos de nós não gastávamos um euro que fosse para salvar uma daquelas vidas? Até um bebé morreu...
Lembro-me agora dos que acusam o senhor Adolfo de ter tentado matar seis milhões. Isso dá três dias dos nossos não é? Ou será menos?
Matámos quantos hoje?
segunda-feira, 1 de junho de 2009
sábado, 30 de maio de 2009
Manhã
nem sombra nem luz
nem sombra da noite
no alvor da madrugada
não sou coisa nem nada
talvez louco
o louco não tem número
o limite da soma é o vazio"
quarta-feira, 27 de maio de 2009
Hoje
Espaço,
Calor,
Pouco mais de um euro, não tão pouco como dois cêntimos,
Frango,
Batatas,
Frango,
Arroz,
Relva,
Garrafas,
Frio,
Chuva,
O velho bar,
Corredor,
Chão,
Noite,
Fogo,
Papel,
Gritos,
Música,
Palavras,
Portas,
E todo o vazio que se esconde algures no meio do ar,
E uma cara, uma voz, uma mão, um sorriso, um par de olhos,
Longe.
segunda-feira, 25 de maio de 2009
domingo, 24 de maio de 2009
Estrada
dos Rinocerontes cor de mel
As fotografias velhas espalhadas pelas paredes agora meio amareladas pelo tempo mas que já foram brancas, cal. As teclas do piano abandonado a um canto. Uma televisão que até mostra imagens coloridas mas que podiam ser só como dantes.
Preto e branco, preto e branco, preto e branco.
Dois gatos, duas cores.
Dois cães, duas ruas, duas casas.
Os ratos são cinzentos. Alguns, pelo menos, que depois há os ratos brancos e os outros de mil e uma cores.
Ratos de mil e uma cores.
Isto vai tudo dos olhos de quem vê...
E se as teclas do piano fossem pintadas de verde e rosa?
O som seria igual que isto há sempre dois lados, o de quem suja as mãos para fazer as cordas cantar e o de quem se limita a fechar os olhos para as ouvir. O som seria sempre diferente, o som será sempre diferente, o som é sempre diferente para quem se senta a ouvir. O verde e rosa de quem toca subitamente descolora. O preto e branco ganham cor.
Mas isto são só analogias de cores, sons e pedacos de carne a bater na madeira.